A pedido da Capes, ABC propõe revisão na avaliação da pós-graduação brasileira
Atendendo a solicitação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a Academia Brasileira de Ciência (ABC) produziu um documento com sugestões para aprimorar o processo de avaliação dos programas de pós-graduação do País, introduzido há mais de 40 anos. No documento, a entidade ressalta que a avaliação dos cursos de pós-graduação da Capes garantiu progressos extraordinários da ciência, na qualificação de recursos humanos e na capacitação de grupos de pesquisa de todo o Brasil.
É o que acredita Débora Foguel, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), coordenadora do documento, para quem a proposta reafirma alguns pontos que fazem parte do DNA da PG brasileira. “Precisamos continuar com a avaliação, que é muito importante para a pós-graduação brasileira. Existe um conjunto de indicadores de pesquisa e ciência, que são números de artigos, por exemplo, que não podemos nos distanciar, mas é preciso agregar outros elementos e outras maneiras para avaliar”, argumenta Foguel.
O relatório da ABC foi elaborado por uma comissão composta pelos acadêmicos Adalberto Ramón Vieyra, João Fernando Gomes de Oliveira, Jorge Almeida Guimarães, Luiz Bevilacqua e Sandoval Carneiro Junior.
O pedido foi estendido a diversas entidades, instituições, coordenações, comissões e grupos de pesquisa de todo o País, dentre elas, a SBPC, que enviou suas sugestões no último dia 10, após Jorge Audy, presidente da Comissão do Programa Nacional de Pós-Graduação (PNPG) da Capes, participar de reunião na SBPC com representantes de cerca de 80 sociedades científicas de todo o País.
Ao apontar trechos importantes do documento, a professora da UFRJ ressalta que “a avaliação é um processo vivo, dinâmico e os programas se adaptam a um formato, de modo que você precisa desfiar o sistema o tempo todo, criando novas diretrizes, novos indicadores’, porque isso guia, no dia a dia, o fazer dos programas, da pesquisa brasileira.”
O texto estabelece 11 princípios para uma nova abordagem na avaliação dos programas de pós-graduação brasileiros, que na visão dos acadêmicos são fundamentais para expandir e qualificar ainda mais a PG brasileira. Abaixo o resumo de cada uma das sugestões:
- Homogeneização do QUALIS das Áreas de forma a criar critérios mais homogêneos de qualificação dos veículos de comunicação da produção científica.
- Estruturar o QUALIS com base nas revistas em que os programas publicaram naquele período.
- Inclusão de indicadores de qualidade daquilo que é produzido pelos programas de pós-graduação através do envio de um conjunto definido de produtos que reflita suas melhores produções acadêmicas, dissertações e teses.
- Auto-inserção dos cursos em quatro Grupos Vocacionais (GV) baseados na natureza das pesquisas realizadas pelos Programas (Grupo I. Pesquisa Fundamental; Grupo II. Pesquisa Básica Estratégica; Grupo III. Pesquisa Aplicada na Área Social; Grupo IV. Pesquisa Aplicada Tecnológica.
- A criação dos GVs levará a uma revisão de indicadores de produção e seus respectivos pesos em função daquilo que se espera de cada GV (“customização”).
- Reposicionamento das atividades de inovação como fundamentais para a pós-graduação brasileira o que levará à criação de novos percursos formativos dos estudantes que passarão a incorporar elementos do setor empresarial.
- Investir recursos na internacionalização dos cursos de pós-graduação, premiando aqueles que tiverem fluxo in e out bound de discentes e pesquisadores, projetos de pesquisa conjuntos, alunos com dupla titulação, disciplinas conjuntas, oferta de cursos em inglês e outras línguas, dentre outras ações.
- Criação de uma cota de bolsas de doutorado no exterior que inclua o estágio do estudante dentro de centros de pesquisa e inovação tecnológica que participariam dos projetos dos estudantes.
- Deve-se fomentar e premiar as ações dos programas voltadas para a melhoria da educação básica, em especial àquelas que contam com a participação dos discentes.
- O destino dos egressos deve ser monitorado pelos programas, já que a natureza e o impacto de sua atividade após o doutoramento (e o pós-doutorado) é um excelente indicador de qualidade do estudante formado.
- A qualidade da formação discente deve balizar e nortear o processo avaliativo e, para isso, as produções (artigos, livros, patentes, obras literárias e de arte etc. que contam com a participação discentes devem ser valorizadas e recompensadas. A Capes deve desenvolver indicadores que avaliem a capacidade que os programas de pós-graduação têm para oferecer no caminho de uma melhor formação de quadros qualificados.
A proposta cita ainda as áreas nas quais o Brasil se tornou líder mundial em geração de conhecimento: medicina tropical, odontologia, parasitologia, agricultura, energia, biocombustíveis e a pesquisa sobre o vírus da zika e microcefalia. Destaca, ainda, setores tecnológicos que avançaram imensamente neste período, como a exploração de petróleo em águas profundas, agricultura tropical, indústria de papel e celulose, produção de aeronaves, plataformas offshore, indústria mecânica e metalúrgica, biocombustíveis e automação bancária.
“Eu diria que, no mínimo, são princípios interessantes para discutirmos, já que tudo que está no documento são coisas para serem trazidas à mesa, para que possamos pensar e debater juntos, que é justamente o que a Capes pediu às instituições”, defende Foguel.
O documento elaborado pela ABC destaca também que o resultado desse desenvolvimento levou o País a ocupar a 8ª posição no ranking de maior Produto Interno Bruto (PIB), segundo dados do Banco Mundial de 2015, e a segunda posição no ranking de maior PIB per capita (US$ 15,359) entre as nações mais populosas. “Certamente essas conquistas encontram suas origens no desenvolvimento científico e tecnológico logrado pelo país nas últimas décadas, em especial pela qualificação de quadros e pela existência de infraestrutura para pesquisa e desenvolvimento”, diz o documento da ABC.
A acadêmica lembra ainda que quando a Capes pediu as contribuições ficou pré-estabelecido um período para trazer as propostas à mesa e abrir um amplo debate, mas o momento turbulento por qual passa o País dificulta a previsibilidade da discussão. “Os próximos passos nós não sabemos quais serão. Estava previsto para acontecer em Brasília, nos meses de maio ou junho, um grande encontro para discutirmos e destrincharmos todas as propostas, mas diante da mudança de ministro, da situação do País, que a cada dia tem rumos mais complexos e complicados, nós acabamos não sabendo direito qual o destino do documento.”
Leia aqui a íntegra do documento proposto.
(Jornal da Ciência, com informações da ABC)